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As alterações climáticas são chatas,
não permitem prever o que vai acontecer amanhã, um aspecto essencial em matéria
de agricultura. Dantes a meteorologia era caracterizada pela constância, tudo
sucedia com uma cadência pré-determinada, cómoda. Esta relação de causalidade,
entretanto, perdeu-se. O Inverno despiu-se do frio e da chuva, tornou-se num
tépido Outono fora de época. A Primavera, este ano arrancou com um fulgor
inóspito próprio de muitos dias de Julho ou de Agosto. As vicissitudes do
aquecimento global tornaram-se madrastas das práticas agrícolas, um hábito que
começou a fazer parte da vida de tantos casais e, noutros casos,
ganhou ainda mais importância naqueles que já tinham essa prática, ao fim do
dia depois do trabalho na Fábrica ou no Armazém.
Mais do que um elogio
ecológico1, os casais –
velhos e novos – recorrem ao cultivo da terra como uma forma de subsistência,
para mitigar a fome ou escondê-la. Sim, não se trata de fugir à preguiça mas de
corporizar uma necessidade básica (A. Maslow tinha razão!), permitindo
contrabalançar os desequilíbrios da economia doméstica. Acabou-se o desafogo
que permitiu fazer o crédito do carro e de outros objectos de consumo. O porta
moedas já não se compadece apenas com a compra de produtos de marcas brancas. O idealismo do passado
(uma certa Reforma Agrária utópica)
anda, hoje em dia, de mãos dadas, com a
sobrevivência pura e dura: arranjar comida por todos os meios... Nesse esforço os casais estão a redescobrir um outro espaço de convívio e de
cooperação. Além da casa, do carro, do Shoping e outros sítios vulgares(...), a
horta – citadina ou não (no Porto e arredores são centenas as pessoas em lista
de espera para as chamadas Hortas Biológicas em terrenos camarários!) – é uma
oportunidade para reinventar a intimidade. Serve para completar o lado
instrumental de um deles (não forçosamente o homem!) com o jeito ou a
sensibilidade do outro cônjuge. Ao aliarmos esforços para produzir algo em
comum (verdadeiramente, nosso!) somos convidados a entrar num jogo de
descoberta de um verdadeiro mundo de detalhes da vida em comum. A convivência
com a terra, com as sementes, com a água, dá testemunho de uma relação
primordial – muito sensorial – que se perdeu nas sociedades capitalistas.
A
civilização em que vivemos inventou um modelo de identidade humana: o HomoUrbanus. Este, quebrou todas as regras de
relação com a Natureza, separou-se dela e ao fazê-lo pôs em causa a sua própria
saúde. A Medicina Contemporânea não tem nada de exótico, o que a domina
reflecte o que acontece na vida das pessoas. A maioria das patologias actuais é
a consequência directa do estilo de vida, do que se come, da falta de exercício
físico, da desregulação dos ritmos biológicos (como é o caso das alterações do
ciclo sono-vigilia e das perturbações do comportamento alimentar!).
Com uma surpreendente modernidade as
práticas agrícolas, o usufruto da terra, inserem-se numa actividade que remonta
aos primórdios da Humanidade e que ajuda a contrariar o destino dos necessitados.
Sem mágoas espalhadas pelo chão, os casais em época de Crise redescobrem
(inesperadamente?) o gosto pelas coisas antigas. Mais do que as veementes
campanhas de consciencialização por parte das correntes militantes da Ecologia,
a Sra Troika e aqueles que justificaram a sua necessidade estão a conduzir os
casais à redescoberta do valor da terra enquanto instrumento produtivo e espaço
relacional.
O amor é uma coisa, a vida é outra. Mas
existem interfaces em que ambos se confundem: a Natureza é uma delas.
Referência Bibliográfica
Referência Bibliográfica
1- Esta necessidade de regresso à
Natureza em Portugal foi muito bem teorizada na Colecção “Viver é preciso”,
através dos Cadernos “Ecologia e Sociedade”, editados em boa hora por Victor
Matias Ferreira na Afrontamento, logo após o 25 de Abril.
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