terça-feira, 19 de julho de 2011

Voos Domésticos
          Vamos imaginar uma visita a uma casa de família. 
Mas convém sermos discretos para não perturbar quem lá está. Por isso, nada melhor do que ver à distância, com a argúcia de uma ave de rapina…
Se fossemos um águia altiva, capaz de voar para onde quiséssemos, quer no campo, quer na cidade, de certeza que, mais tarde ou mais cedo, acabaríamos por encontrar uma casa (uma esplendorosa mansão ou uma humilde habitação de 2 assoalhas) onde existiria um casal em conflito. 
Às tantas, até não seria preciso procurar durante muito tempo!
As zangas, as discussões, os conflitos, os desentendimentos acontecem em todos os casais, mesmo que a famosa “crise dos 7 anos” ainda esteja distante! Quando menos se espera, a divergência acaba por surgir. 
Trocam-se palavras. Afirmam-se opiniões. Luta-se pelo poder na relação. Os olhares incendeiam-se. As mãos aquecem. Os corpos ficam inquietos. No calor da discussão diz-se o que se quer e o que não desejamos (salta-se a tampa e pega-se no machado de guerra!).
Tudo é falado.Analisa-se a relação amorosa, com toda a severidade possível. Chamamos a atenção para aquilo que cada um fez de mal, o que se sentiu em relação ao comportamento da outra pessoa. Os sonhos desfeitos.A realidade mais ou menos cruel da vida a dois.
Chega uma altura em que a refrega fica incontrolável, é como um rastilho de pólvora. Parece uma batalha campal em que dois exércitos se enfrentam violentamente. Mesmo que não haja agressão física, os corpos não ficam indiferentes às divergências verbais e às emoções inconciliáveis. 
À medida que a discussão azeda, os dois membros do casal mimam-se de insultos: tanta “ternura” meu Deus! De dedo em riste, importa revelar os “podres” da outra pessoa, os seus insondáveis vícios, o seu lado mais maquiavélico. Enfim, uma resma de pecados…
Não se olham a meios, o que interessa é magoar o outro(a), deixá-lo(a) de rastos. Fazê-lo(a) sofrer! Contam-se as armas. Todos os argumentos são legítimos: os insultos, a chantagem, as ameaças. Neste arsenal de impetuosidade, talvez o expediente mais sórdido seja a ameaça de suicídio, sobretudo, quando os filhos estão a assistir à zanga dos pais. Independentemente do desfecho do combate conjugal, as crianças (ou adolescentes!) nunca irão esquecer ao que acabam de assistir. A cicatriz ficará para sempre. Ainda que a reseliência esteja presente lá num resto de dignidade humana de cada um dos intervenientes, aquela cena ficará gravada indelevelmente no sistema límbico dos mais novos.
Neste cenário de violência ninguém sai vencedor. Os protagonistas até podem ficar convencidos das suas pequenas vitórias pessoais. Iludem-se. Julgam que ganharam: “desta vez deixei-o de rastos”sic, “hoje é que ela ficou a ver quem eu sou”sic.
E há casais em que estas loucuras se repetem anos a fio.Como se não fosse nada, vão-se destruindo aos poucos. Até parece que o amor vai aguentando…
Ainda dizem que loucos são aqueles que frequentam as consultas de Psiquiatria…

sábado, 9 de julho de 2011

Nada me faltará - Opinião - DN - Última Crónica de Maria José Nogueira PINTO

Há textos inconfundíveis. Porque nos deixam a pensar. Porque mexem com o que há de mais profundo na condição humana. Porque elegem o Amor como um manifesto irrecusável e um sólido compromisso com a Vida. Este é um deles. Mais do que uma crónica semanal num Jornal de referência estamos perante uma prova de Amor, o que já é raro nos dias que correm! William Shakespeare costumava dizer que é possível enganar a morte através da actividade artística, tendo um filho e dedicando-nos às lides amorosas. Infelizmente, a morte nunca se deixa enganar mas, enquanto ela não nos confronta com as suas exigências, sobra muito para darmos à Vida e aos que amamos. Esta mulher personificou a força das coisas e foi um exemplo de Vida.
Nada me faltará - Opinião - DN